Águas Selvagens | 2022

Águas Selvagens | 2022

Um homem de meia idade se prepara para banhar-se num quarto de hotel. É interrompido pela camareira, que adentra o local abruptamente e sem aviso prévio para realizar a limpeza do quarto. Enquanto discute com o homem para que deixe o quarto, a camareira sexualmente se insinua para ele. É interrogada pelo homem sobre sua idade, e confessa possuir 16 anos. O homem responde: “Quatro anos”. A adolescente, sem compreender, o corrige: são dois anos para que ela complete dezoito, e não quatro. É rebatida: “Quatro anos a mais de prisão”.

A figura masculina apresentada é o asqueroso protagonista do longa Águas Selvagens, Lúcio Gualtieri (interpretado pelo uruguaio Roberto Birindelli), ex-policial que é contratado como investigador particular para desvendar um assassinato ocorrido na tríplice fronteira Brasil – Argentina – Paraguai. E a cena referida é um exemplo do nível de compromisso assumido pelo filme perante temas tão graves como a pedofilia: nenhum. Pelo contrário, o tema se torna motivo de gracejo por um protagonista que ainda cria um perfil falso no Facebook para se passar por um adolescente e relacionar-se com sua filha de 15 anos com quem não tem proximidade.

Esse homem é o herói do filme. É aquele por quem todas as mulheres são curiosamente atraídas sem qualquer motivo. É o que ganha todas elas. É o que desvenda um esquema criminoso cuja natureza sequer fica clara (uma mistura de tráfico de pessoas com pedofilia e adoção ilegal; e assassinatos, claro), que usa a tríplice fronteira como um manto de propaganda que jamais é abordado.

O filme, que é de 2020 e que deixou de ser lançado por motivos pandêmicos, parece um trabalho amador mal-acabado que usa e abusa de drones que reproduzem imagens pouco nítidas para realizar cenas externas que nada acrescentam, cuja desnecessidade é somada à uma trilha sonora cafona e pessimamente encaixada, que chega a ser abruptamente cortada para continuar em outro momento da composição em uma única cena.

Não houve, aparentemente, nem mesmo compromisso técnico com a finalização do longa. Além do já aqui mencionado, há momentos em que a filmagem torna-se lenta não como recurso artístico, mas claramente como falha de recursos. Os cortes causam estranheza, o roteiro apresenta sérios erros de continuidade e a trama, ininteligível, não chega a lugar nenhum.

Águas Selvagens é um resultado triste e falho de uma coprodução entre países latino-americanos, cuja parceria deveria ser celebrada. A história dos cinemas brasileiro e argentino é por demais rica para que o presente longa se venda às suas custas. 

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