Babilônia | 2022

Babilônia | 2022

Embora ainda bastante jovem, Damien Chazelle possui uma filmografia que atrai a admiração de cinéfilos por todo o mundo. Chamou especial atenção do público e da crítica seus premiados filmes Whiplash e La La Land, que lhe rendeu a condição de mais jovem diretor a receber o Oscar de melhor direção (2017). Temas que estiveram presentes em seus filmes anteriores se repetem em seu novo longa, Babilônia, em especial o interesse pela música e pela história do cinema. A expectativa criada em torno de seu lançamento, no entanto, acaba sendo frustrada em um filme pretensioso e que ao longo das mais de 3h de exibição tem dificuldade em envolver o espectador com seus personagens.

Babilônia se inicia com Manny Torres (Diego Calva) enfrentando a difícil missão de transportar um elefante para o topo de uma montanha. Desde já, a cena que introduz o filme indica como fatos inusitados serão um traço recorrente no longa. A montagem dessa cena é bastante dinâmica e o humor, na medida certa, funciona como uma ótima introdução para Babilônia. Os méritos da cena inicial, contudo, não se repetem no decorrer do filme.

Excetuada a cena inicial, todo o primeiro ato de Babilônia é marcado pelo exagero e pelo caos. A trilha exorbitante acompanha uma festa também toda ela marcada pelo desregramento. Música, performances, drogas, bebidas, sexo, tudo ocorre em demasia. O elefante em meio a essa verdadeira orgia, acreditem, é o que há de menos extravagante. Esses excessos, contudo, tornam a experiência visual bastante cansativa ao longo de períodos longuíssimos de exibição destinados a representar essa festa. O toque de humor, que poderia tornar a experiência um pouco menos exaustiva, também passa do ponto e não cumpre esse papel.

O segundo ato se inicia de forma silenciosa, marcando a introdução do áudio no cinema e a dificuldade que essa novidade traz para as gravações. O que poderia ser um excelente contraste com o primeiro ato, contudo, logo é abandonado. A dificuldade em manter o silêncio nos estúdios de gravação leva à fúria de diretores, atores e técnicos. Novamente, o exagero toma conta, se transformando, assim, em um traço inescapável de Babilônia. Apenas no terceiro ato há uma pequena mudança nessa abordagem e o drama dos personagens ganha destaque um pouco maior.

Um aspecto histórico mais geral atravessa a narrativa: a passagem do cinema mudo para o cinema falado. A magia do cinema, o deslumbramento e os excessos que acompanham o sucesso, bem como as mudanças que decorreram da chegada do som ao cinema foram objeto de inúmeros outros filmes, sejam eles recentes (Era uma vez em… Hollywood) ou não (Crepúsculo dos Deuses). Nesse contexto, vemos a dificuldade de diferentes profissionais do cinema de se adaptarem às novas situações. As performances grandiosas e os visuais impressionantes poderiam ser úteis aqui para indicar justamente a ascensão e queda dos personagens, reforçando como rapidamente se passa da euforia à depressão e como o sucesso é provisório, sendo também os artistas descartáveis quando é do interesse da indústria. Esses traços, inclusive, estão presentes de forma mais contida em La La Land e também em Whiplash (muito especialmente na cena final). Ocorre que, diferentemente dos longas anteriores, em Babilônia Chazelle peca na construção de seus personagens e a narrativa se enfraquece.

A temática geral do cinema é trabalhada a partir de arcos dramáticos envolvendo diferentes personagens. Nelie Laroy (Margot Robbie) – “a menina ardente” – é uma jovem atriz que ascende rapidamente, ainda no tempo do cinema mudo, devido à sua desinibição e sensualidade. Veremos, porém, que aquele sucesso não lhe acompanhará com o desenvolvimento do cinema falado. Personagem central da trama, conhecemos a Sra Laroy apenas de forma superficial. Isso ocorre, em certa medida, porque também somos levados a acompanhar a história de Jack Conrad (Brad Pitt), ator consagrado do cinema mudo e que vive drama semelhante com as mudanças na indústria. Ele que era antes o galã que arrancava suspiros da plateia, torna-se motivo de piada com a chegada do som. Há, ainda, Manny Torres, que é quem percebe na mudança do mercado justamente a possibilidade de ascensão. A sua concretização, contudo, não se dará plenamente devido à sua fixação com Laroy, agora inoportuna para o novo momento da indústria. 

O resultado, porém, de vários personagens introduzidos com grande importância é justamente a impossibilidade de conhecê-los a fundo. Com isso, torna-se difícil criar empatia e compreender os dramas vivenciados por cada um deles. Isso para não dizer de outros pequenos arcos dramáticos que envolvem personagens menores, como a Lady Fay Zhu (Li Jun Li), responsável por inserir letreiros nos filmes no tempo do cinema mudo e que logo verá sua função desaparecer.

A sobreposição de histórias faz de Babilônia uma obra bastante ambiciosa que, para frustração dos fãs de Chazelle, mesmo em mais de 3h de exibição tem dificuldade em conectar o espectador com cada um dos personagens. Com tudo isso, o tributo ao cinema e as reflexões sobre a arte, de forma mais ampla, se tornam fracas. Pior ainda para Babilônia que sua estreia aconteça, no Brasil, uma semana depois de Os Fabelmans. O filme de Spielberg faz, com excelência, a costura entre dramas pessoais de personagens e a magia do cinema. Apesar do elenco estrelado, da bela trilha sonora e dos méritos técnicos na reconstrução histórica, Babilônia é uma obra que se pretende grandiosa, um verdadeiro épico, mas que peca justamente por não conseguir fazer o simples.

Nota

Babilônia estreia nos cinemas do Brasil no dia 19/01/2023.

Author

  • Rodrigo Badaró

    Natural de Belo Horizonte, é Cientista Político (UFMG), cruzeirense, músico e aspirante a crítico de cinema. A maior especialidade está em enxergar a política em todos os lugares, especialmente naqueles que mais ama: o futebol, a música e o cinema.

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