Conheça o Festival ECRÃ

Conheça o Festival ECRÃ

Festival gratuito de cinema e artes experimentais completa sete edições 

“Este projeto surgiu da vontade de questionar a indústria do cinema e seus “elementos primordiais” e de dar espaço para os filmógrafos experimentarem de forma livre na produção audiovisual, chegando à uma nova maneira de ver as obras.” 

O Festival ECRÃ é dedicado a filmes e obras que não são exibidos no circuito tradicional de cinema, focado em conteúdos experimentais e que abraça formatos diversos em suas categorias (Videoartes, Performances, Games, Instalações e Filmes de curta, média e longa-metragem), o transformando em um festival rico em experiências multiculturais. O ECRÃ acontece presencialmente no Rio de Janeiro desde 2017, onde começou com apenas 10 filmes em formato de instalação, palestras, shows e performances em um espaço na Gávea, passou por dois anos de pandemia em formato online e em 2022 adotou um formato híbrido, voltando ao presencial, mas sem abandonar o digital. O festival nunca parou de crescer em público e em número de obras recebidas – em 2023, com mais de 900 trabalhos inscritos, ampliou seu espaço de exibição, que hoje acontece no Estação NET Botafogo de Cinema e na Cinemateca do MAM.

Este ano acontece a sétima edição do festival, novamente em duas etapas – presencial e online. O evento, que já trouxe muitos nomes importantes do cinema mundial às telas brasileiras, como Ken Jacobs, Ben Russell, Paula Gaitán, Luiz Rosemberg Filho, Lewis Klahr, Billy Woodberry, e que em sua última edição, contou com a presença de um dos maiores diretores de cinema experimental contemporâneo, o cineasta americano James Benning, que veio ao Brasil pela primeira vez apresentar seu filme e ministrar uma masterclass exclusiva, continua surpreendendo com uma seleção requintada de obras, muitas delas vindas diretamente de grandes festivais internacionais como Rotterdam, Berlim, Sundance, BFI, BAFICI, entre outros.

Noite de abertura do sexto Festival ECRÃ @ Cinemateca do MAM

Na parte de games, performances e instalações, o ECRÃ retorna com a experiência imersiva do óculos de realidade virtual, com duas obras brasileiras que ocupam este equipamento. Na edição passada, o festival contou com a presença do artista Sul Coreano, Seyeong Yoon, que veio ao Brasil apresentar sua instalação em uma sala na Cinemateca do MAM. Nessa edição, as instalações e performances seguem na Cinemateca, com áreas e corredores totalmente reformados para recepção do público e ocupações artísticas. As obras selecionadas na categoria games, assim como as de videoartes, serão exclusivamente para a etapa online do festival, que inclui também parte da seleção de filmes e algumas obras exclusivas, como performances com estreias internacionais.

Instalação do sul coreano
O artista Sul Coreano Seyeong Yoon em sua instalação @ Cinemateca do MAM

Um dos destaques da sétima edição é a primeira exibição no Brasil de “A Longa Viagem do Ônibus Amarelo” de Júlio Bressane e Rodrigo Lima, filme que totaliza 432 minutos. Este longuíssima-metragem esteve no festival de Rotterdam e no BAFICI e é uma espécie de filme-diário de viagem de Bressane, com muitos recortes de arquivo de filmagens que perpassam sua enorme filmografia. O canadense Alvin Santoro faz um remake digital de “A Região Central” do realizador experimental Michael Snow em “RGNCNTRL” e adapta o game Red Dead Redemption, fazendo um trabalho semelhante ao que Snow fez com uma câmera. Outro conteúdo precioso na programação é o programa dedicado ao cineasta Stan Brakhage, um dos maiores nomes do cinema experimental da história. Entre curtas, médias e longas, o programa reúne sete filmes do diretor produzidos entre as décadas de 50 e 60. 

Os destaques acima ilustram um pouco a diversidade do Festival ECRÃ e chamam atenção, pois dificilmente em salas de cinema convencionais, ou fora de uma cinemateca, o espectador teria chance de assisti-los, além de dar chance a obras nacionais independentes e a novos realizadores mostrarem seus filmes. 

Na sexta edição, o ECRÃ contou com um programa especial chamado Mestres do Cinema Brasileiro, promovido por Cavi Borges, que exibiu diversos clássicos nacionais com a presença de diretores para mesa redonda, como Neville D’Almeida, Walter Lima Jr, Helena Ignez, André Parente entre outros! Trazer obras como estas e tantas outras que compõem a grade de selecionados do festival, democratiza o acesso ao cinema e as artes e expande o olhar do consumidor para filmes que vão desafiar sua zona de conforto cinematográfica. 

Cavi Borges e Neville D’Almeida @ Estação Botafogo

Conversamos com Daniel Diaz, diretor geral e  idealizador do festival, sobre a trajetória do ECRÃ e sua visão em relação ao festival. Também conversamos com Pedro Tavares, um dos diretores e curador de longa-metragens, sobre algumas questões acerca do cinema experimental e sua experiência com o ECRÃ. 

  • Entrevista com Daniel Diaz: trajetória do Festival ECRÃ e a importância da readaptação na produção de eventos culturais no Brasil pós-pandemia

Mari Dertoni: Olá Daniel, como idealizador do festival, conta um pouco sobre o começo do ECRÃ e sua visão ao criar o festival, comparada com sua visão hoje, na sétima edição. Como tem sido essa trajetória de trabalhar com cultura e artes no Brasil, mudou muito?

Daniel Diaz: Esta é uma história que adoro contar!

A primeira edição do ECRÃ foi meu projeto final da faculdade de Design, com apenas 10 selecionados e dois dias de evento. Um mês depois fomos convidados pela Cinemateca do MAM, que já era nossa parceira, para fazer a exibição das obras no auditório de lá. Um detalhe é que os outros dois Diretores do ECRÃ, Rian Rezende e Pedro Tavares tiveram papéis diferentes neste início: respectivamente, um era meu orientador e o outro teve seu curta selecionado.

Comparando com a sétima edição e tentando resumir, é claro o quanto a criança cresceu e o quanto ela já anda sozinha, no sentido de ser muito além do projeto idealizado em 2016. Porque sozinho ele não se faz. A equipe e as parcerias cresceram desde lá. E acho que é aqui que o Festival ECRÃ consegue ainda existir, respondendo sobre o como é trabalhar com cultura no Brasil. É tudo feito por pessoas e instituições que acreditam muito no projeto, veem seu potencial e importância. Tenho que ser justo e saber que Cinema e Arte Experimental não é para todo mundo, mas parte do que tentamos fazer com nossa Curadoria e variedade de Categorias é trazer para mais perto do público essas obras que tanto nos interessam e mostrar sua abrangência e possibilidades.

Se me perguntassem lá atrás como seria a sétima edição, eu responderia algo diferente. Assim como me pego viajando em como será o 10° Festival ECRÃ, e ele, independente se se, quando e onde, vai ser diferente do que vejo em meus sonhos acordados.

Mari Dertoni:  Você também cuida da curadoria da parte que faz do ECRÃ mais do que um festival de cinema, um festival multicultural, que abraça performances, games, instalações… qual sua ligação com esse universo e sua visão sobre essa diversidade de conteúdos no ECRÃ?

Daniel Diaz: Pior que outro dia estava pensando nisso. Antes de falar de minha relação com cada Categoria, quero comentar que na primeira edição, o conceito inicial do ECRÃ era focado em interpretar e exibir de formas diferentes as Obras que recebíamos. Tivemos até uma reunião com os artistas selecionados, mostrando o espaço, a casa em que o evento ia acontecer, e detalhando como e onde cada Obra seria colocada: uma dentro de uma churrasqueira, outra no teto. Festival ECRÃ chegou a ser uma sigla: Festival Experimental e Colaborativo de Realizações Audiovisuais. 

Mas com o tempo o conceito foi se reinventando e parece que todo ano experimentamos em novos formatos junto dos padrões que temos de estrutura e processo. O que isso tem haver com a pergunta, é para mostrar que sempre foi um Festival conectado com várias formas de se trabalhar (ou experimentar) o audiovisual, nos palcos, nas galerias, nas salas de cinema.

Mari Dertoni: Muito bacana, parece ser um trabalho muito entrelaçado com sua história e sua personalidade…

Daniel Diaz: Não vou conseguir agora detalhar cada conexão, mas, de certa forma eu tenho ou tive uma conexão com cada categoria (talvez vá exagerar em algum ponto aqui hehe). Filmes: eu trabalho com filmagem e edição de eventos, clipes e filmes; Games: um dos meus lazeres prediletos, jogar e saber de videogames; Instalações e Artes Interativas: parte da origem do ECRÃ, de exibir os vídeos/filmes que recebemos em formato mais ‘instalativo’; Performances: já fui ator e agora danço como hobbie; e Videoartes: talvez a Categoria mais misteriosa do Festival, ela vem sempre sendo ressignificada e estamos pensando em mudar ela de nome até, focar mais nas artes para as redes sociais, web, novas mídias, gifs, aquilo que não se encaixa em outro lugar, saca? – mas minha conexão aqui é o dia a dia das redes sociais e as visitas à museus, que regularmente faço desde criança devido ao incentivo da minha mãe.

Olha, acho que ficou confuso, mas o importante da existência delas é que, desde sempre, queríamos abranger as mais variadas formas de se trabalhar o audiovisual, não só nos filmes. Vai saber se outras Categorias vão surgir.

Mari Dertoni: A etapa online do ECRÃ surgiu em decorrência da pandemia de COVID-19, não foi? Como foi trabalhar completamente online e qual foi a importância disso para o ECRÃ? Visto que hoje, duas edições depois do retorno presencial, o formato foi mantido em etapas híbridas e com categorias exclusivas.

Daniel Diaz: Sim, correto. A pandemia e seu efeito na cultura e na vida é algo que nem precisamos detalhar aqui, mas com as restrições colocadas foi uma loucura e correria achar e fazer o nosso Streaming da forma que a gente imaginou. Discutir o formato disso, liberação das Obras e Atividades. Parece que é só colocar tudo num lugar e pronto, mas se parar para ver, cada um tem outras formas de ter um festival Online.

Felizmente, se puder dizer, a ida do ECRÃ para o Online foi um estrondo e nos levou para lugares inimagináveis. Desde a quantidade de público, pessoas que começaram a conhecer o ECRÃ nessas edições, formas de exibir Performances, adição da Categoria de Games e muito mais. Fomos eleitos pela Folha como um dos 5 melhores Festivais Online (todos eram) em 2020.

Temos a noção da diferença de experienciar um Filme na tela do cinema ou ver uma Performance ao vivo no mesmo local físico do artista, mas mantemos ainda as duas Etapas, como evento híbrido, principalmente por dois motivos: o alcance nacional e mundial que o Online permite. Permite que o evento chegue a pequenas cidades do Brasil, chegue ao outro lado do mundo e para o conforto da sua casa (ou metrô – aí já não sei se é tão confortável). O outro ponto é que algumas Obras funcionam muito bem, ou APENAS funcionam neste formato. Como o caso de algumas Performances e as Videoartes, que são exclusivas desta Etapa.

Ela pode funcionar um dia de forma diferente, acontecer tudo junto? Sim, como comentei, tem dezenas (ou mais) maneiras de usar a capacidade do Online em um evento.

Mari Dertoni: O ECRÃ é um festival independente, gratuito, sem patrocínio e sem fins lucrativos. Também é um festival que abraça a arte experimental, com conteúdos que o público secular não está acostumado a  ver em salas de cinema e galerias. O que te move a continuar realizando as edições desde então e o que mais te gratifica neste trabalho?

Daniel Diaz: Uma pergunta até difícil de responder na verdade. Não é fácil continuar e fazer o Festival ECRÃ existir a cada ano que passa, mas o gosto que tenho pela produção do evento e a vontade de mostrar esse tipo de Obras e arte para o público é algo que sempre me motiva.

Não falei, mas a pergunta inicial de onde surgiu o ECRÃ foi (e cito meu relatório lá da faculdade): “Este projeto surgiu da vontade de questionar a indústria do cinema e seus “elementos primordiais” e de dar espaço para os filmógrafos experimentarem de forma livre na produção audiovisual, chegando à uma nova maneira de ver as obras.” 

Sabe, mostrar que a gente pode fazer cinema, vídeo, teatro, jogos de tantas maneiras e não só nos padrões que, muitos, já vem nos cansando. Não que não adore o que o mainstream nos oferece, claro que consumo também. Mas vem no ECRÃ para ver o que mais as pessoas produzem. 

O que mais me gratifica é o amor que a equipe interna tem pelo projeto e a qualidade das Obras e Atividades que conseguimos programar para o evento. A gente não sabe o futuro, mas sempre que uma edição termina eu penso (depois de uma semana de descanso): quero mais.

Mari Dertoni: Muito obrigada Daniel! E que venham mais muitas edições do ECRÃ!

  • Entrevista com Pedro Tavares: cinema experimental, curadoria e mercado brasileiro de nicho

Mari Dertoni: Pedro, como é pra você fazer um festival de cinema independente no Brasil, especificamente no Rio de Janeiro? que mesmo sem patrocínio vem crescendo a cada edição?

Pedro Tavares: Bem complexo. São muitos meses de produção e com pouquíssimos recursos que vêm das inscrições e das campanhas de apoio. Temos poucas opções para divulgação do evento, por exemplo, por conta dessa limitação financeira. Graças ao boca a boca o festival tem crescido anualmente e a torcida é que para as próximas edições o ECRÃ se estabeleça no calendário cultural da cidade. 

Mari Dertoni: O que você consegue sentir em termos de recepção do público, visto que os filmes do ECRÃ, que fogem totalmente dos filmes exibidos no circuito tradicional de cinema, hoje são exibidos também em salas de cinema como o ESTAÇÃO, que conta com uma grande circulação de público convencional?

Pedro Tavares: A intenção é essa mesmo. O confronto. Importante que as pessoas saiam das sessões com uma nova sensação, de que existe um outro tipo de cinema e outras experiências além de um filme narrativo, por exemplo. Isso pode acontecer de diversas maneiras, dependendo da obra. Tentamos de alguma forma mesclar estas abordagens também na hora de selecionar onde cada filme será exibido. Nosso público que frequenta a Cinemateca já conhece melhor o ECRÃ e podemos nos arriscar mais. 

Mari Dertoni:  Qual a importância do consumo do cinema experimental pra você? Como ele reflete no seu trabalho também como cineasta e para quem escolhe fazer esse tipo de cinema no Brasil? Tem espaço? Percebo que precisa furar uma grande bolha para que muitos filmes cheguem ao público secular e acho que o ECRÃ acaba democratizando um pouco isso…

Pedro Tavares: Creio que o cinema experimental nos mostra possibilidades para quem está interessado em fazer filmes e que não tem o aporte de editais ou muita grana principalmente para nós que estamos no Brasil. Vendo filmes assim algumas ideias surgem, a empolgação aparece, a criatividade aguça. Isto posto, também acho fundamental a forma de diálogo com novas formas de imersão e expansão do cinema e na abordagem de linguagens que a liberdade de produção de filmes assim nos permite. O ECRÃ é sim uma das vitrines para este tipo de produção e que tem crescido no Brasil, o que é muito legal. 

Mari Dertoni: Sobre seu trabalho de curadoria, o que você considera mais importante na seleção de obras para um festival? Como tem sido esse trabalho com o ECRà até aqui? Vejo que a cada ano mais obras são enviadas, né?

Pedro Tavares: Bem, creio que cada curador tem o seu método e interesses particulares que estarão sempre em diálogo com a produção e outros curadores de seus respectivos eventos. No meu caso penso primeiro na qualidade da obra e como ela pode chegar ao público. Tento me tirar também do papel de peça central deste trabalho, ou seja, não é sobre o meu gosto necessariamente e sim sobre as experiências que o público pode ter. Recebemos muitas inscrições, o que é incrível, e também faço uma longa pesquisa externa, pois o festival ainda não é tão conhecido no exterior. 

Mari Dertoni: Nessas últimas 6 edições, qual foi o momento mais marcante e gratificante pra você?

Pedro Tavares: São alguns, na verdade. No último ano trouxemos o James Benning para o Rio para uma masterclass e foi muito especial ter um de nossos realizadores favoritos participando do festival e curtindo a cidade. Durante o ano de 2020 fomos o primeiro festival a ocorrer online no auge da pandemia e conseguimos, assim, levar muitos filmes para diversos cantos do mundo. A versão online também nos aproximou de diversos realizadores como Geraldo Sarno que participou de uma linda mesa redonda. Meses depois, infelizmente, Geraldo nos deixou por conta do COVID. Em 2021 Ken Jacobs participou de uma mesa junto à sua esposa Flo e bateram um papo incrível com Paula Gaitán.

O evento acontecerá entre os dias 29 de junho e 2 de julho no Estação Botafogo e na Cinemateca do MAM com entrada gratuita e entre os dias 6 e 9 de julho online através do site do festival com parte das obras selecionadas. PROGRAMAÇÃO COMPLETA AQUI.

O Festival ECRÃ é um evento sem fins lucrativos e tem sua entrada gratuita. Para ajudar a custeá-lo, acesse: www.festivalecra.com.br/contribua.

O Festival ECRÃ tem apoio do Museu de Artes Modernas do Rio de Janeiro; Grupo Estação; Cavideo; Departamento de Artes & Design PUC-Rio; EDT.; Bessa Produções; Cogumelo Corp.; JL Ribas; e é apresentado por 5D Magic, 7 a 1 Filmes e Cara Feia.

Contato para imprensa: sandravillelajo@gmail.com, ecra@festivalecra.com. 

Author

  • Mari Dertoni

    Jornalista carioca, estudou cinema na Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, certificada em roteiro pelo Instituto de Cinema de São Paulo. Ama cinema de horror e os grandes clássicos.

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