Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um | 2023
Uma maratona de cenas de ação e um vilão invisível para Ethan Hunt
Estamos em 2023 e um assunto não poderia ser mais relevante do que o uso da Inteligência Artificial (IA) e as especulações dos perigos que esse tipo de avanço tecnológico pode gerar em escala mundial, impactando nossa forma de ver os fatos hoje e encarar a veracidade dos acontecimentos. Conhecemos novos termos como o “deepfake”, onde a imagem e o som não são mais confiáveis, estamos todos sujeitos a sermos replicados via IA em uma fotografia, em gravações simuladas de áudio ou mesmo em vídeo, de maneira muito fidedigna. Um dos dilemas de Tom Cruise, que volta a viver o inconfundível Ethan Hunt em Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um, é, junto de sua equipe, enfrentar um inimigo invisível e se deparar com artimanhas que muitas vezes desafiam a confiabilidade dos movimentos de um vilão virtual.
O sétimo filme da franquia Missão: Impossível não foge dos artifícios de ação, muito eficientes, que o diretor Christopher McQuarrie vem utilizando em suas obras. McQuarrie assina a direção dos dois filmes anteriores Missão: Impossível – Nação Secreta (2015) e Missão: Impossível – Efeito Fallout (2018), além de já ter trabalhado com Cruise em 2012, em Jack Reacher. Essa familiaridade com o gênero e com o ator em questão, só engrandecem o trabalho feito nesta sequência que conta com uma maratona de acontecimentos espetaculosos e traz um Ethan Hunt imbatível, surgindo como uma entidade em meio a uma densa penumbra em sua primeira aparição em tela. Um homem que convive com a morte e que não tem vergonha de demonstrar o imenso sentimento de valor que dá a seu grupo de amigos.
Hunt é um protagonista rebelde, assim como John Wick – herói interpretado por Keanu Reeves na franquia homônima –, que muda as regras do jogo e não atropela seus ideais por uma missão – age com comprometimento consigo mesmo. São dois homens que lidam constantemente com a morte e possuem personalidades difíceis, raramente se submetendo a regras que não sejam as suas próprias. Mas, ao contrário do herói-justiceiro monossilábico vivido por Reeves, Cruise faz de Hunt um personagem mais humano, menos destroçado pelo passado do que Wick, porém igualmente raivoso e implacável. “A própria encarnação do caos”, como é chamado por um dos homens que coloca sua cabeça à prêmio.
McQuarrie entrega um filme com duração mais longa do que os anteriores, com enredo e trama simples. Mistérios e desafios para recuperar duas partes de uma chave que, ao se encaixar e ficar completa, pode abrir a fechadura que contém algo que todos os líderes mundiais sempre quiseram: o controle de uma tecnologia que poderá os elevar ao máximo de poder. Para dificultar, o objeto está nas profundezas, trancafiado em um submarino naufragado. É até estranho falarmos de submarino e bilionários agora, outra semelhança mórbida com a realidade e a tragédia recente com a embarcação que carregava um pequeno grupo de pessoas aos destroços remanescentes do Titanic. No longa, a embarcação não comporta pessoas, mas uma “entidade” virtual altamente perigosa.
Se na franquia John Wick as tramas se desenvolvem pelo instinto de vingança e no misticismo criado em torno do protagonista, em Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um, a trama segue pelo fio do instinto protecionista de Hunt, tentando combater a ganância de líderes mundiais em busca de meios de dominação global. As cenas de ação são exuberantes, não deixando de lado o auxílio inevitável do CGI, mas abrilhantadas pelas coreografias bem ensaiadas e o empenho incansável de Cruise, que aos 61 anos, ainda assume cenas sem o uso de dublê e não tem receio de ser filmado em primeiríssimo plano! O ator treinou por mais de três anos para a acrobacia de Speedflying, onde salta de um avião com uma espécie de parapentes, aterrissando a velocidades superiores a 80 km/h durante as filmagens em Lake Valley, no Reino Unido.
Com uma montagem fluida que traz mais intensidade e agilidade a cada sequência e a fotografia que opta diversas vezes pelo uso de close-ups e planos e contra planos muito aproximados dos atores, absorvemos melhor os momentos de tensão e sentimos maior envolvimento com os personagens. Outra semelhança com John Wick 4 (2023), foi o uso de câmeras que rotacionam em 360 graus em cenas com veículos na rua em plano aberto, artifício que traz mais dinamismo em movimentos rápidos.
No primeiro ato temos Hunt cavalgando e fugindo de tiros no deserto em meio a uma tempestade de areia, onde ele reencontra com Ilsa Faust (Rebecca Ferguson). No segundo ato, Hunt está em uma perseguição de carro longuíssima ao lado de sua nova parceira, a ladra profissional Grace (Hayley Atwell), onde um algemado ao outro, rendem também bons momentos cômicos com a péssima direção de Grace entre os solavancos do caminho, atropelando motos e descendo escadas ao volante de um mini-carro amarelo. No ato final e mais intenso, temos o espetaculoso salto de moto de Hunt diante de um penhasco! Acompanhamos lutas intensas sobre um trem em alta velocidade, socos, chutes e facadas, enquanto Grace tenta frear o trem que segue em direção ao abismo.
Há um clima de flerte constante entre Hunt e Grace, pois McQuarrie não seria bobo de deixar de lado o charme de um dos maiores galãs do cinema atual e Hayley Atwell abrilhanta a trama somando ao elenco! Além disso, há uma forte abordagem sobre o laço de amizade que se perpetua entre o grupo de velhos companheiros que resgata certa nostalgia dos filmes anteriores, composto por Hunt, Luther Stickell (Ving Rhames), Benji Dunn (Simon Pegg) e a mais nova integrante, Grace. A trama simples não atrapalha o entretenimento do espectador fã de ação, que não vai apontar o dedo para a tela e dizer “nossa, mas que mentira isso”. Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um é mais um filme de gênero que abraça os exageros e os absurdos sem compromisso com a verossimilhança, se repete um pouco em partes auto explicativas, mas é recheado de criatividade nas cenas e que claro, deixa a para a Parte Dois o desfecho desse segredo submarino.