Dinheiro Fácil | 2023

Dinheiro Fácil | 2023

O cinema estadunidense não perde oportunidades para reafirmar a centralidade que procura ostentar no mundo, e manter, assim, os Estados Unidos nessa mesma posição. Elevam-se acontecimentos e personalidades à nível global, enaltecendo fatos que por vezes não são tão interessantes assim fora do país.

Quando o assunto é Wall Street, surfa-se na onda do hype em que esse próprio mercado bizarramente se sustenta. Nem tudo que acontece no reduto capitalista exerce influência em larga escala. Esse universo especulativo do capital funciona através da criação de expectativas que nem ele mesmo compreende. Fato é que dificilmente alguém compreenderá plenamente Wall Street.

Trazer para as telas eventos que causaram certo estardalhaço no mercado e política estadunidense sempre foi objeto de interesse. Mais recentemente, Adam McKay, bebendo muito na fonte de Scorsese em O Lobo de Wall Street (mas sem jamais alcançá-lo) lançou uma tendência satírica e frenética que passou a exigir do espectador uma compreensão da lógica desse capital que é um tanto impraticável no Cinema. O resultado acaba influenciando negativamente em Dinheiro Fácil, novo filme de Craig Gillespie (Eu, Tonya e Cruella): a exaustão do espectador diante de tantos conceitos financeiros, personagens e grandes corporações, e a impressão de que esse filme já foi visto.

Dinheiro Fácil baseia-se em fatos reais ocorridos entre 2020 e 2021, quando uma certa revolução popular em Wall Street causou a queda e o prejuízos de gigantes bilionários. Keith Gill (Paul Dano), um rapaz comum que guarda algumas economias com a esposa Caroline (Shailene Woodley), torna-se líder de uma comunidade do Reddit quando resolve investir sua reserva na compra de ações da empresa GameStop, subvalorizada pelo mercado. Sob a influência de Gill, outras pessoas comuns fazem o mesmo, investindo o chamado Dumb Money, fazendo inflar exponencialmente as ações da empresa, que gerou, inclusive, uma investigação de fraude no Congresso Nacional estadunidense.

Gillespie até consegue se afastar da montagem e da câmera frenética seguida por McKay, quando, por sua temática, essa é uma linha que até esperamos que seja seguida, o que se mostra uma decisão acertada. Entretanto, não há força em seu caminho. O diretor possui a clara intenção de fazer da iniciativa e rebuliço causado por Gill uma tendência de luta de classes, uma tomada de poder popular de Wall Street, um modo de forçar a distribuição do capital. A impressão é que há ali apenas a intenção mesmo, uma vez que o espectador não sabe se tenta entender o funcionamento desse mercado de ações e o impacto causado em de cada uma das grandes corporações que tomaram prejuízo, ou se se identifica com as pessoas comuns seguidoras de Gill.

Dinheiro Fácil se contradiz muito. Ao passo que tenta mostrar esse ideal revolucionário, escolhe por dar a mesma importância em tempo de tela aos empresários bilionários, trazendo nomes como Seth Rogen e Sebastian Stan para interpretá-los. Até existe um tom de ironia nas ações de cada um desses donos do capital, ressaltada pelos furos ao isolamento social impostos pela pandemia, o descaso com o crescimento da valorização da GameStop, a prepotência ali presente. Porém, essa divisão bem demarcada acaba por deixar o protagonista e sua mensagem muito mornos e menos importantes. É como se, muito embora toda a ação involuntariamente coordenada por Gill não tivesse qualquer impacto real aos bilionários. Não vemos o prejuízo, não vemos a queda.

Craig Gillespie consegue fugir da linha ultra frenética dessas sátiras político-econômicas à la McKay, mas no final cansa tanto quanto. A ideia de luta de classes que ele tenta explorar morre na praia. Tudo soa genérico demais. Não é nem tão engraçado, nem tão irônico, é um meio de caminho bem morninho.

Nota:

Filme visto através de nossa cobertura da 47ª Mostra de Cinema de São Paulo, acompanhe tudo aqui

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