Come Closer | 2024

Come Closer | 2024

A dor do luto usada pelo moralismo

Perder um ente querido é uma das situações que nos colocam diante da nossa inegável condição: a morte. O tempo e o acaso são as instituições máximas que relegam o ser humano à fragilidade de sua vida. A dor é inexplicável, indizível e profunda. É um momento de reflexão àqueles que ficam, hora repensar e ressignificar sua própria existência, seus atos e suas relações. Esse sentimento de luto vem servindo como um dos grandes temas dramáticos do Cinema, onde se explora justamente a inconstância e a incerteza da vida. É o que Come Closer, filme israelense de Tom Nesher, tenta fazer ao contar a história de duas jovens que se ligam pela mesma perda.

Nati (Ido Tako) tem cerca de dezoito anos, carrega consigo a vivacidade da juventude e a paz de espírito de alguém apaixonado. Pedala sua bicicleta enquanto ouve um rock israelense no fone de ouvido, sem mais preocupações. Nem o fato de um carro o atingir enquanto pedalava parece o abalar; ele levanta e continua. É o dia do seu aniversário e ele tem planos para sair com sua namorada mais tarde. Isto, até ser surpreendido e “sequestrado” por seus amigos e por sua irmã para uma festa surpresa à beira-mar. Esse desvio de rota acaba levando Nati à morte. Depois de passar a noite festejando entre bebidas e drogas, resolve acordar no meio da madrugada para visitar a namorada, com quem tinha faltado o compromisso. Ao atravessar a rua é atropelado (pela segunda vez no dia) e morre.

É essa a motivação da narrativa de Come Closer, o que nos apresenta a dois lados divergentes, mas ligados pela morte de Nati: Maya (Daria Rosen), a ingênua e tímida namorada secreta, e Eden (Lia Elalouf), a irmã mais velha rebelde e ciumenta. De um lado, o encontro romântico que o manteria vivo; de outro, a representação da vida mundana que o matou. Essa dualidade será o conflito levado ao longo do filme, traçando um dilema que acaba simplificando o sentimento do luto. A composição de Eden como subversão imoral da história não tem nenhuma sutileza, gerando diversos subterfúgios para a continuidade da trama.

Nasher cria uma estética moderna, jovial, assim como seus personagens. Há muitas cores neons, música eletrônica, piercings, tatuagens e cabelos descoloridos. Todos esses elementos remetem à irmã mais velha desgarrada da família, que sai para baladas, que se relaciona com um homem casado, pinta o cabelo de vermelho e usa maquiagens extravagantes. Seu comportamento é extremamente violento, possessivo. É ela quem força o irmão a fumar maconha e a beber na festa, quem dança de biquíni na frente da fogueira e sensualiza diante dos outros, ou seja, quebra com a moralidade dos “bons costumes” daquela sociedade.

Depois da morte de Nati, Eden reage de forma ainda mais violenta e auto-punitiva. O peso da culpa é uma das fases do luto, portanto é compreensível que uma personagem tão instável quanto ela acabe sofrendo de tal maneira. O que é contestável é como Nasher faz disso algo extremamente artificial, no sentido de que não há qualquer profundidade em seu flagelo, sendo tudo mostrado na superfície, com imagens didáticas e que se repetem no seu propósito. Em uma cena em que vasculha o guarda-roupas do irmão, ela precisa vestir-se com suas roupas para reafirmar sua possessividade. Primeiro coloca sua cueca e se olha no espelho, fingindo ter um pênis; depois veste várias peças de roupas de Nati, uma sobre a outra, freneticamente. É como se o próprio filme duvidasse de sua capacidade imaginativa, abrindo intervalos explicativos durante toda a projeção.

Quando Eden descobre que seu irmão namorava Maya às escondidas, reforça-se mais uma vez sua personalidade com diálogos e gestos nada sutis. Ela persegue Maya até que ela pare e aceite conversar. Na verdade, a conversa se torna, novamente, a exposição da possessividade de Eden sobre o irmão. Mesmo que Maya seja retratada com delicadeza, nada impede que Eden “cuspa” em sua cara o quanto o irmão a amava mais do que à namorada, isso de acordo com seu próprio julgamento. Mesmo após a humilhação, Maya se sente atraída pela cunhada, fazendo com que as duas tenham mais encontros dali para frente. Elas se tornam amigas, saem algumas vezes e trocam mensagens constantemente.

Mais uma vez Come Closer reafirma seu moralismo, quando coloca a atração de Maya por Eden como a depravação de sua vida. A jovem tímida e ingênua é subvertida em alguém que vai até o submundo de Israel, sai com Eden para beber e dançar. Assumindo novamente a posição de Nati, Eden se transforma na nova namorada de Maya, então as duas se entregam ao sexo em meio às reminiscências do falecido.

Essas duas linhas divergentes que acabam convergindo seguem até o ato final. O processo de luto acaba quando Eden repensa suas atitudes, quando abandona a vida mundana, a violência contra si e contra os outros a sua volta, para aceitar a morte do irmão, se reaproximar da família e “sossegar”. Até o seu cabelo que era vermelho, agora aparece pintado de preto, assim como sua maquiagem extravagante dá lugar ao rosto limpo.

No fim, Come Closer é uma obra sobre o luto para a geração atual, que consome coisas rápidas, que não quer pensar além do que se vê nitidamente. São sensações que não duram, que não são legítimas. Não nos resta muito a pensar ou refletir sobre a complexidade de perder alguém amado, pois a todo momento somos lembrados de que estamos vendo um filme que precisa atender demandas e convenções narrativas. Mesmo se assumindo como esteticamente audacioso, abraçando o visual colorido e descolado da juventude, Come Closer acaba construindo personagens femininas estereotipadas e que sempre acabam rumando ao moralismo barato.

Nota:

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