Bad Painter | 2025
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Albert Oehlen faz excêntrico autoretrato com Udo Kier e Kim Gordon
Conhecido internacionalmente por suas “pinturas ruins”, o artista alemão Albert Oehlen é considerado um dos mais influentes e controversos pintores contemporâneos. Pertencente ao movimento neoexpressionista alemão (também conhecido como Neue Wilde) surgido nos anos 80, muito influenciado pelo Expressionismo, Simbolismo e Surrealismo, que buscava resgatar a pintura como meio de expressão e identidade da cultural alemã, Oehlen trabalha com o abstracionismo em suas obras. Bad Painter é um filme dirigido pelo próprio Oehlen, onde, de forma sarcástica e bastante caricata, conta sobre seu processo criativo e mostra sua personalidade excêntrica ao lidar com apreciadores e estudantes de arte em seu primeiro longa-metragem.
Bad Painter fez estreia mundial no Festival Internacional de Cinema de Roterdã e é estrelado por Udo Kier, ator alemão com extensa carreira no cinema, participou de Bacurau, de Kleber Mendonça Filho, e que foi escalado para seu próximo longa gravado em Recife, O Agente Secreto. O filme carrega um tom bastante autodepreciativo, onde acompanhamos o artista em sua casa, primeiramente sendo entrevistado por ninguém menos do que Kim Gordon, musicista, conhecida por sua atuação como baixista da banda de rock alternativo Sonic Youth. Gordon, além de entrevistadora, também assume a voz de uma narração que parece refletir os pensamentos de Oehlen.
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O longa adota um formato de docuficção ou mockumentary, mescla os momentos de entrevista, onde o artista explica e mostra seus métodos de pintura, com outras inserções narrativas que nem sempre parecem funcionar bem, como quando somos apresentados a Charlie (Charlotte Taschen), uma jovem que parece ser uma acompanhante de Oehlen, que o irrita enquanto faz barulho de sua respiração intensa ao meditar no quintal da casa, enquanto ele tentar pintar. Em outro momento somos levados a uma cena onde os dois saem para jantar, há close-ups em câmera lenta de suas bocas mastigando, do movimento do vinho dentro da taça, conotando uma quebra de realidade um tanto lisérgica. Por vezes são inseridas algumas cenas rápidas que remetem ao body horror, como um olho sendo perfurado ou momentos com iluminação vermelha trazendo uma clima mais pesado e um sentido de deslocamento conectivo ao filme.
Todo o filme parece querer brincar, muitas vezes de forma autoindulgente, com o universo peculiar do comércio de arte e do cotidiano artístico, onde é por vezes pretensioso e busca, à sua maneira, ser subversivo. As obras de Oehlen carregam ares de uma espécie de “anti-arte elevada”, intensificando um sentimento snob e blasè nas pessoas do meio, hilariamente representadas por jovens ricos apreciadores de arte, que parecem ter uma verdadeira síncope quando são postos em frente à tela do pintor alemão.
Kier encarna perfeitamente a caricatura do artista, com olhar distante, meio alucinado, que só pensa em sua arte e em como ser validado por ela. Para abrilhantar o elenco diferentão, a atriz Grace Zabriskie, conhecida por trabalhar com David Lynch em Twin Peaks e em Império dos Sonhos, interpreta a mãe de Oehlen. Ela aparece em pouquíssimas cenas, mas sua presença é certamente marcante. O longa também conta com a interessante participação de Michael Chow, artista e restaurador chinês, que interpreta a si próprio em uma engraçada interação com a visita de Oehlen à sua galeria, onde os dois fazem uma disputa bastante egoica sobre suas obras e processos de criação.
Bad Painter assume uma linguagem cada vez mais surrealista e conceitual em sua forma à medida que o filme avança, o que até combina com a excentricidade de seu protagonista e com o tom cômico e caótico proposto, mas isso pode incomodar alguns espectadores, pois não há um fio de continuidade muito coerente. Certamente a interpretação de Udo Kier e as boas participações são pontos altos do filme. O longa acaba funcionando como uma colcha de retalhos, unindo referências e estilos para externar o complexo mundo de Oehlen aos olhos dele mesmo.