A Mulher no Jardim | 2025

A Mulher no Jardim | 2025

A materialização do luto

A dor da perda de um ente querido é sempre devastadora, e as formas de lidar com isso variam bastante. Pode-se encontrar conforto na família, em amigos, em lembranças de quem partiu; ou nunca encontrar um alento, afundando-se em solidão, tristeza e, no caso de Ramona (Danielle Deadwyler), protagonista de A Mulher no Jardim, novo longa de terror psicológico do diretor espanhol Jaume Collet-Serra, em uma parcela de culpa. 

Collet-Serra é um cineasta que vem traçando uma carreira interessante dentro do cinema de gênero, passeando sempre entre filmes de horror como A Casa de Cera (2005) e A Órfã (2009), e filmes de ação como Sem Escalas (2014) e Bagagem de Risco (2024). Agora ele se une a Blumhouse, produtora que não para de lançar obras de horror de baixo e médio orçamento, para falar de luto e de trauma de uma maneira interessante, visto que a temática já é bastante explorada dentro do gênero.

Ramona é uma mulher de meia idade, que acaba de perder o marido e cria dois filhos pequenos, Annie e Taylor, em uma modesta casa isolada no interior dos Estados Unidos. Vivendo um luto que parece corroer sua alma, ela se vê estagnada, a casa que carece de reparos prometidos por seu finado marido, continua com problemas e com falta de abastecimento de itens básicos como alimentos e ração para o cachorro da família. Tudo o que Ramona consegue viver é a sua dor, tão forte que faz dela um fantoche que espera a própria morte chegar.

Trabalhando as nuances de um intenso sofrimento, rogar por um saída pode se tornar algo assustadoramente perigoso em A Mulher no Jardim. O filme, que flerta com o folk horror, transfere para uma materialização espectral as súplicas de Ramona, fazendo com que a família viva momentos apavorantes dentro da velha casa, de onde se avista um enorme terreno verde com uma mulher (Okwui Okpokwasili), sentada em um banco sob o sol, totalmente vestida de roupas negras e um véu preto lhe cobrindo o rosto, como uma viúva.

O design de som abusa de ruídos agudos e dissonantes, enquanto a fotografia lida bem com a pouca luz no interior da casa. O longa brinca com o contraste do ambiente externo, que é extremamente ensolarado e claro, com a escuridão de dentro da residência, onde a mulher misteriosa que se aproxima pouco a pouco, tenta entrar. Assim como o vampiro mais famoso do cinema, o espectro da mulher se conecta com os vivos através de sombras. Sem luz não há sombra, logo algumas cenas, como quando se usa uma lanterna piscando no sótão escuro, criam um efeito interessante e tenso na interação da criatura com as crianças e com Ramona.

A Mulher no Jardim conta com um elenco super reduzido (três adultos e dois atores mirins), excelente e todo composto por pessoas negras. A direção trabalha bem com esse minimalismo que se estende à locação praticamente em um único ambiente. Faz uma boa analogia entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos em um paralelo de realidade invertida, brincando com a dicotomia dos acontecimentos, com o que é realidade e com o que é um jogo psicológico, ou uma vivência pós-morte no universo do filme. Trama e atmosfera se unem e Collet-Serra consegue fazer um longa imersivo, que embora trabalhe um tema que já estamos cansados de ver e usando alguns recursos comuns em uma história simples, ele funciona.

Nota

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  • Jornalista carioca, editora e crítica de cinema. Tem foco de interesse e pesquisa em cinema de gênero e feito por mulheres.

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