G20 | 2025

Como salvar o mundo se não consegue salvar nem o próprio filme?
Nem mesmo o enorme talento de um ator ou atriz consegue sustentar um filme quando seu roteiro e sua direção são pífios. G20, lançamento da Prime Video dirigido por Patricia Riggen e estrelado por Viola Davis, Antony Starr e Anthony Anderson, falha em tudo que tenta: seja nos tratamentos inadequados a importantes temas contemporâneos, seja na tentativa de ser um empolgante filme de ação.
Na trama, durante a cúpula do G20 que reúne inúmeros chefes de Estado na África do Sul, ocorre um ataque terrorista que os faz reféns, e cabe à Danielle Sutton (Viola Davis), presidente dos Estados Unidos da América, salvá-los todos, valendo-se de suas habilidades adquiridas na época em que foi militar.
Por certo, essa não parece ser uma das melhores quadras históricas para sustentar a posição dos Estados Unidos da América como os grandes salvadores dos pobres e oprimidos de nosso planeta. Mas neste filme, em pleno 2025, ainda se aposta neste reforço da posição dos americanos como os grandes tutores das outras nações e os grandes responsáveis por proteger o mundo “de tantos vilões” por aí espalhados.
Em G20, a presidente dos Estados Unidos mostra-se comprometida a acabar com a fome da África. Em uma cena constrangedora, a personagem, durante uma coletiva de imprensa, afirma em tom professoral que na maioria dos países subsaarianos, os agricultores não têm acesso “a bancos como nós, na hora de comprar sementes para plantar, eles dependem do dinheiro que colocaram em uma meia ou esconderam”.
Para isso, a presidente Sutton oferece uma solução perfeita: o uso de uma moeda digital para esses agricultores que seja fácil e segura, afinal, como seu tio dizia: “você pode dar um peixe a um homem a alimentá-lo por um dia ou pode ensiná-lo a pescar e alimentá-lo por toda vida”. Sim, é este ditado o escolhido pelo roteiro para dotar a cena de um peso maior.
É por este intento misericordioso que a presidente Sutton, na companhia de sua secretária do Tesouro nacional, Joana Worth (Elizabeth Marvel), será alvo de críticas pelos representantes dos demais países, que precisam ser convencidos a participar deste plano de ajuda humanitária desenvolvido pelos Estados Unidos da América.
Quando menciono o tratamento inadequado a certos temas, é sobre o roteiro reforçar, por exemplo, a ideia do continente africano como quase primitivo (falta de acesso à bancos, por exemplo) e os Estados Unidos como os grandes tutores destes “pobres” países africanos.
Em G20, tenta-se explorar diversos temas em voga na contemporaneidade, mas a forma como isso é realizado é muito ineficiente, quando não problemática em suas abordagens que reforçam estereótipos pra lá de datados. O longa-metragem tenta discutir a presença feminina na política, manuseio de inteligência artificial e deepfake, uso criptomoedas e mais outros temas, todos irmanados em uma abordagem açodada e sem profundidade.
Não bastasse todos esses problemas, a forma indecentemente rasa e absolutamente expositiva com que tudo é tratado mina por completo o longa-metragem. Não são poucos os momentos em que o espectador é tratado como alguém que não conseguiria compreender nada que não seja falado da forma mais explícita possível em cena.
Este é o nível de simplificação da narrativa. Seria ingenuidade minha achar que isso não caberia mais mesmo neste tipo de blockbuster? Sim, talvez. Contudo, não posso deixar de mencionar que, por ser um filme estrelado por Viola Davis, atriz que também se destaca por sua militância política, é de se estranhar que a direção e roteiro cometam tantos destes “deslizes”.
Durante a realização da cúpula entre os países, o grande golpe é dado por parte dos seguranças do local, pertencentes a uma empresa privada. Este grupo é liderado pelo australiano Edward Rutledge (Antony Starr), cujo interesse é fazer filmagens das grandes lideranças globais para, a partir do uso de inteligência artificial, manipular suas falas a partir do deepfake, e divulgá-las mundialmente, fazendo com que a economia global se desestabilize e ele, pessoalmente, ganhe muito dinheiro com criptomoedas.
Durante este ataque, alguns líderes que estavam na cúpula escapam do domínio de Rutledge e seus comparsas, entre eles, a presidente Sutton, seu segurança/agente de segurança Manny (Ramon Rodriguez), a primeira dama sul-coreana Han Min Seo (MeeWha Alana Lee) o primeiro ministro inglês Oliver Everett (Douglas Hodge) e a chefe do FMI Elena Romano (Sabrina Impacciatore). É este grupo liderado pela presidente ianque que tentará sobreviver em meio à perseguição dos vilões da trama.
O filme possui cenas de ação que, apesar de serem bem concebidas, são mal executadas. Em sua esmagadora maioria, não empolgam o espectador. Muito disso se deve, também, ao fato de que os acontecimentos de G20 se mostram muito previsíveis, podendo ser antecipados até mesmo pelo espectador com a menor aptidão para tal feito.
Como poderia se esperar, o filme se encaminha ao final com todos os clichês de filmes do gênero. Contudo, o buraco é ainda maior. Como se a utilização de estereótipos problemáticos já não bastasse ao longo de G20, o grande motivo por detrás daquele ataque ao evento internacional foi motivado por inveja feminina, afinal, a grande mentora e parceira de Rutledge no ato terrorista era Joana Worth, a secretária de tesouro ianque que sempre invejou o posto de Sutton.
Na parte final, a direção se vale de falas da protagonista tais como “você é a infiltrada!” e “você nos traiu” para se assegurar que absolutamente todos vão compreender o plot twist do longa metragem, fazendo com que o resultado seja embaraçante.
Assim, G20 é uma prova de que mesmo o talento de uma grande atriz como Viola Davis sucumbe por completo em um filme com direção e roteiro tão precários, em que determinadas cenas possuem o condão de constranger parcela dos espectadores.