Pianoforte | 28º Festival É Tudo Verdade

Pianoforte | 28º Festival É Tudo Verdade

Dedicação ao extremo e o peso do talento

Pianoforte é um longa-metragem documental polonês que acompanha o dia a dia dos concorrentes da famosa e conceituada Competição Internacional Chopin de Piano, que acontece a cada cinco anos em Varsóvia, na Polônia. Não é uma tarefa fácil fazer um registro desses, onde há uma repetição de muitos dias de exaustiva prática e preparação dos pianistas junto a seus professores e mentores, sem resultar em uma obra monótona ou cansativa. Pensando nisso, a direção de Jakub Piatek trabalha com uma montagem dinâmica no longa, que mescla esse pequeno diário preparatório de alguns dos participantes, com imagens de fora dos quartos de hotéis e salas de ensaio. Piatek insere momentos recreativos e descontraídos, colocados curiosamente sob fundos de música contemporânea, como a da banda Tame Impala, quebrando o ar tão sério e formalista que um concurso erudito desses carrega consigo.

Esta competição de piano de Chopin é conhecida por revelar grandes talentos da música e por isso jovens de todo o mundo se preparam desde a infância para participar. É uma competição muito rigorosa, assim como o cotidiano de todos os músicos mostrados no documentário. China, Japão, Itália, Canadá, e tantos outros países presentes, com pessoas de culturas e idades completamente distintas, concentradas em um só objetivo. À medida que a competição avança, nos afeiçoamos mais a uns do que a outros participantes e o documentário faz com que escolhamos nossos favoritos e torçamos por eles, quase como em um reality show

foto. Darek Golik

 Na primeira rodada são 160 concorrentes que vão sendo eliminados gradativamente, até restarem apenas 10 pianistas que chegam à final nesta competição que pode ser considerada como as “Olimpíadas do Piano”. Pianoforte nos convida a refletir sobre o peso do talento de cada um e como cada indivíduo reage a ele. Alguns com severa seriedade, outros com leveza e descontração, outros ainda com extremo desespero e dor. A melhor parte do mergulho nesse universo é sem dúvida conhecer a personalidade dos participantes, alguns muito jovens entre seus 15 e 17 anos, outros mais experientes, passando dos 30 anos. 

Apesar dessa discrepância de reações que presenciamos em Pianoforte, todos têm em comum um enorme nervosismo e uma constante pressão pela vitória por seus maestros e/ou familiares, um peso invisível que aflige a todos e nos mostra que quase ninguém ali está sequer pensando em uma posição que não seja a de número um. O talento é uma dádiva, mas também um fardo e uma responsabilidade enorme quando se tem ambições de sucesso no ramo.

Assim como em reality shows, existe um massacre psicológico cruel nesta competição. Alguns participantes chegam a desistir por se sentirem incapazes e diminuídos diante de tamanha dedicação de seus concorrentes. A todo momento, entre algumas piadas e ironias de bastidores, percebemos um peso enorme e uma exigência técnica que não aceita nada menos do que a perfeição dos pianistas. Comentários como sobre “gastar o prêmio em terapia“, e a força que a competidora russa de apenas 17 anos precisa mostrar ao se decepcionar com o resultado, quando em pratos, sua mentora pede que engula o choro e chore em casa. Ela mesmo com os olhos cheios de lágrimas contidas, tem que sair sorridente para tirar fotos com os fãs. 

Pianoforte foi exibido no Festival de Sundance 2023 e no Brasil no 28º Festival Internacional de Documentários “É Tudo Verdade, recebendo Menção Honrosa na Competição Internacional de longas e médias-metragens. A obra traz uma visão intimista dos bastidores dessa competição que pode mudar definitivamente a vida dos vencedores. Por mais dinâmica que seja a montagem, o documentário acaba ficando no meio termo entre o instigante e o exaustivo, pois mesmo com jovens personagens divertidos e interessantes, em dado momento se torna cansativo assistir às repetições rotineiras. Penso que se convertido em um programa com episódios, seria mais confortável acompanhar pausadamente cada registro de evolução dos participantes, ao invés dessa saga toda de uma única vez.

Nota

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  • Jornalista carioca, estudou cinema na Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, certificada em roteiro pelo Instituto de Cinema de São Paulo. Ama cinema de horror e os grandes clássicos.

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