Melhores filmes dirigidos por mulheres em 2023

Melhores filmes dirigidos por mulheres em 2023

Além de um ano de retomada das produções audiovisuais, 2023 marcou relevante ocupação de espaços em prol das mulheres na direção. Mundo afora, tivemos importantíssimos filmes de alto nível dirigidos por mulheres, o que mostra que, ainda que não com a rapidez que gostaríamos, as mulheres estão tomando as rédeas do cinema de qualidade e ganhando cada vez mais destaque nas produções, indicações e premiações. Países como a Ucrânia e a Palestina, onde o conservadorismo é dominante, produziram filmes que constam nessa lista. Também filmes de países como México, Argélia, Chile e Brasil, fugindo dos holofotes predominantemente Estadunidenses.

As mulheres do Coletivo Crítico, Mari e Natália, prestigiando e celebrando essas produções, selecionaram os melhores filmes dirigidos por mulheres em 2023. A grande maioria dos filmes foram assistidos em Festivais, Mostras, no Cinema, Streaming ou via Cabine de Imprensa. São eles:

• Anatomia de Uma Queda

Direção: Justine Triet
País: França

É possível reduzir uma pessoa a provas processuais? Tais evidências correspondem, de fato, à realidade, ou são um amontoado de coisas manipuláveis de acordo com a melhor história a ser contada? Anatomia de Uma Queda, de Justine Triet, filme vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, não só levanta esses questionamentos, mas enlaça o espectador num filme de tribunal que não se deixa romantizar. A queda do corpo. A queda daquela família. A queda de Sandra. A anatomia aqui é sobre todos esses corpos que caem, e Justine Triet os destrincha com conjecturas, mostra a total impossibilidade de certezas diante da complexidade do ser humano e suas ambiguidades. Não há como explicar o que jamais será exato. A sociedade e a Justiça se mostram satisfeitas com recortes e histórias interessantes. 

Leia a crítica de Anatomia de Uma Queda aqui (por Natália Bocanera).

Onde assistir: O filme foi exibido na 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e estreia nos cinemas brasileiros em 25 de janeiro.

• Crescendo Juntas

Direção: Kelly Fremon Craig
País: Estados Unidos

Segundo longa da Kelly Craig que fala diretamente com a mente adolescente. Divertido, engraçado e profundamente feminino. As questões levantadas são sobre os percalços de uma menina em desenvolvimento, aprendendo a lidar com as mudanças em seu corpo e mente, e a amadurecer seu entendimento sobre fé e religião, em meio a uma família com dilemas a esse respeito. Uma delícia de filme, que te pega pela mão e conduz o espectador de forma leve e cativante.

Onde assistir: Disponível na HBO Max

• Mato Seco em Chamas

Direção: Joana Pimenta e Adirley Queirós
País: Brasil

A violência em Mato Seco em Chamas não é explícita, como em Bacurau, por exemplo. Aqui a violência é implícita e inerente como meio de resistência e de sobrevivência legítimas. Há tiros secos, pequenas luzes no escuro, incêndios, sons de helicópteros, ruídos e muitos vestígios, mas o confronto fica no extra-campo e isso basta. Basta para sangrar o sangue retirado da tela, deixado de lado e posto nas mãos de quem os derramou sem precisar nos trazer traumas visuais violentos. Parece um novo jeito de se fazer cinema no Brasil, um aperfeiçoamento do que os longas anteriores de Adirley já indicavam, agora mais poderoso e imersivo, misturando mais ficção com recortes cruciais da realidade contemporânea do país. 

Onde assistir: Disponível no Globo Play, e para aluguel no YouTube, Apple TV e Google Play Filmes e TV.

Leia a crítica de Mato Seco em Chamas aqui (por Mari Dertoni).

• Showing Up / Esculturas da Vida

Direção: Kelly Reichardt
País: EUA

Reichardt “desromantiza” o trabalho artístico, fazendo um retrato mais niilista do mesmo. Com um naturalismo em sua abordagem, uma das grandes surpresas de 2023, um filme leve e gostoso de assistir e de se refletir sobre. Protagonizado por Michela Williams, trata de nuances do processo criativo, do lidar com a arte e com o estado de espírito e emocional do artista.

Onde assistir: Disponível para assistir na Globo Play.

• Pedágio

Direção: Carolina Markowicz
País: Brasil

Pedágio, traz uma interessante reflexão sobre o conceito de “cura gay” e a diretora Carolina Markowicz, que também dirigiu o premiado “Carvão” (2022), mais uma vez explora a temática LGBT em um de seus filmes. O longa, além de debochado e bastante irônico, traz características extremamente brasileiras, desde a escolha e preparação de elenco, locação e um texto que dialoga de forma mais direta com o espectador. Traz algumas pitadas de momentos cômicos e bastante críticos à hipocrisia religiosa e preconceituosa de nossa sociedade.

Onde assistir: Em exibição nos cinemas

Leia a crítica de Carvão aqui (por Mari Dertoni).

• Saint Omer

Direção: Alice Diop
País: França

O segundo filme de tribunal da nossa lista. A solidão de uma mulher senegalesa que tenta provar, diante de um duro tribunal francês, que não compreende porque matou sua própria filha pequena. Com a grande maioria das cenas dentro da sala de julgamento, a protagonista se veste com tons que se confundem com sua pele e com as paredes de madeira, tornando-a quase invisível ao tentar defender seu ponto de vista para os demais. Uma forte e difícil conexão é criada entre as mulheres no decorrer dos depoimentos. O filme expõe ideias complexas e sensíveis sobre os laços de maternidade e a invisibilidade da dor. Mães e mulheres, em culturas, raças e etnias diversas, estamos todas conectadas. Mas uma mãe e mulher negra jamais será inteiramente compreendida por outras. Diop traz misticismo ao filme de tribunal para trazer um recorte de conexão pelo gênero e pela raça de forma muito poderosa.

Onde assistir: Disponível na Globo Play.

• A Memória Infinita

Direção: Maite Alberdi
País: Chile

Um documentário bastante corajoso, dirigido por Maite Alberdi, delicado e apaixonante. A Memória Infinita trata de registrar os dias de declínio da sanidade e da deterioração da memória de Augusto Góngora, veterano jornalista chileno que atuou fortemente e fez parte de registros importantíssimos no Chile durante a ditadura. Um filme sobre ternura e parceria, através da cumplicidade de um casal e sobre como lidar com o fim da vida de seu grande amor. Além de um forte reforço sobre a importância dos registros, que a mente pode apagar, mas que feitos pela câmera, se eternizam.

Onde assistir: Disponível no Paramount Plus

• Entre Mulheres

Direção: Sarah Polley
País: EUA

Quando mulheres falam, homens escutam e tomam nota. Não contestam e só opinam quando lhes é solicitado. No interior de um celeiro, onde se passa maior parte de Entre Mulheres, de Sarah Polley (de Alias Grace e Histórias que Contamos), reúnem-se gerações e unifica-se a complexidade carregada pelo ser humano feminino que, em que pese oprimido e violentado, precisa decidir nunca somente por si só, mas pela coletividade, inclusive, masculina, presente e futura. A coletividade feminina, aqui, se une com o sentimento mais poderoso, a arma mais combativa contra o patriarcado e a agressão sexual, segura na palma de suas mãos, esperando para ser reencontrada: a sororidade.

Onde assistir: Disponível no Prime Video, e para aluguel no YouTube, Apple TV e Google Play e TV.

Leia a crítica de Entre Mulheres aqui (por Natália Bocanera).

• How To Have Sex

Direção: Molly Manning Walker
País: França/Grécia/Reino Unido

Um filme bastante doloroso de assistir, a partir do momento em que ele não é mais sobre diversão. A normalização e a invisibilidade do abuso são desconcertantes e mesmo de cara fechada e sem ânimo para mais nada, o sofrimento da protagonista passa quase em branco por seus amigos. Molly Walker reforça a importância de se reparar nos pequenos detalhes, onde mora o desconforto e na linha tênue que é a diferença entre uma relação consentida e uma violência. Muitas vezes a violência contra a mulher é muda, entranhada na normalidade da aceitação das dinâmicas das relações nas sociedades patriarcais.

Onde assistir: Disponível para assistir na Mubi Brasil

• Incompatível com a Vida

Direção: Eliza Capai
País: Brasil

A dor dilacerante nos seus mais complexos significados fez com que Capai buscasse outras mulheres com experiências semelhantes à sua. O documentário se alterna entre os registros da diretora e entrevistas com essas mulheres, numa rede potente de troca e compartilhamento de histórias, medos, pesadelos, expectativas, frustrações e dores, que não se limitam às vivências de cada uma, mas se tornam um debate sobre saúde e políticas públicas, e uma reflexão poderosa sobre maternidade, morte, luto, e sobre o que é ser mulher. A diretora constrói essa conexão de histórias com a sensibilidade e crueza necessárias ao tema de forma um tanto mística.

Onde assistir: Disponível na Mubi Brasil.

Leia a crítica de Incompatível com a Vida aqui (por Natália Bocanera).

• Os Cinco Diabos

Direção: Léa Mysius
País: França/Estados Unidos

Um drama que explora aspectos sobrenaturais para abordar temas como maternidade, rejeição, casamento, preconceito racial e experiências LGBT. Adèle Exarchopoulos protagoniza essa viagem conflituosa e enigmática por liberdade emocional.

Onde assistir: Disponível na Mubi Brasil e para aluguel na Apple TV

• Barbie

Direção: Greta Gerwig
País: EUA

Num mundo onde o olhar cinematográfico masculino busca atingir o hiper-realismo mesmo nos filmes de “boneco” e coloca em risco a potencialidade imaginativa, Greta Gerwig faz o oposto. Assume a boneca, a fantasia, a afetação, para expandir o criativo e usar desse fio para aproximar Barbie de nós. O caminho que leva Barbie até o mundo real é o mesmo que trilhamos em nossa jornada infantil de autoconhecimento e amadurecimento: é preciso andar de patins, percorrer um deserto, os mares, pegar um avião e encarar o que vem depois disso. É necessário se apegar ao ideal de um matriarcado como o da Barbielândia para que minimamente possamos, na vida adulta, acender e reacender o que une mulheres no mundo: a sororidade, que a diretora desperta de forma tão intensa.

Onde assistir: Disponível no HBO Max, e para aluguel no YouTube e Google Play Filmes e TV.

Leia a crítica de Barbie aqui (por Natália Bocanera) e um artigo sobre o filme e a diretora aqui (por Mari Dertoni).

• Huesera: The Bone Woman

Direção: Michelle Garza Cervera
País: México/Peru

Um body horror mexicano que faz uma crítica original sobre maternidade e desenvolvimento dessa e de outras questões em relações queer. Causa certa aflição para quem tem problemas com barulhos de estalos de ossos, consegue trazer momentos bastantes desconfortantes. Huesera mescla drama com folclore místico e rituais regionais e da cultura do México. O longa tem um final sutil e muito bem resolvido.

Onde assistir: Disponível no Prime Vídeo

• Vidas Passadas

Direção: Celine Song
País: Coréia do Sul, EUA

Vidas Passadas

Às vezes podem acontecer conexões entre pessoas que parecem inexplicavelmente inseparáveis, e é sobre esse tipo de conexão que a diretora sul-coreana Celine Song desenvolve em seu primeiro longa-metragem. Vidas Passadas nos faz acompanhar a trajetória de duas vidas que se encontram primeiramente na infância e depois seguem seus rumos por caminhos completamente diferentes. O filme é uma investigação sentimental em muitos níveis, atravessando décadas e longas distâncias. Vidas Passadas trabalha com maturidade duas jornadas sentimentais dolorosas, que envelhecem, mudam e ganham forma cada vez mais nítida.

Onde assistir: Em exibição nos cinemas

Leia a crítica de Vidas Passadas aqui (por Mari Dertoni).

• Dançando no Silêncio (Houria)

Direção: Mounia Meddour
País: Argélia/França

O segundo longa da diretora Mounia Meddour é um filme potente, uma explosão de expressão da dor em forma de dança. Uma dança muda que é uma rede de apoio para mulheres traumatizadas por homens num contexto argelino de pós guerra. Mais uma vez, Meddour  conversa diretamente com as mulheres de uma forma sensível e cirúrgica.

Onde assistir: Disponível na Globo Play

• Paraíso em Chamas 

Direção: Mika Gustafson
País: Suécia, Itália, Dinamarca, Finlândia

Qualquer família que sofra com a ausência de seu provedor, fará com que os integrantes mais vulneráveis aprendam a se virar sozinhos, ou dependam do auxílio de terceiros. Em Paraíso em Chamas, segundo longa-metragem da diretora sueca Mika Gustafson, vencedora da Mostra Horizonte no Festival de Veneza, somos trazidos à realidade hostil de três irmãs que aprendem “na marra”, a lidar com a primeira situação citada. Laura é a irmã mais velha (16 anos), e junto de Mira (12 anos) e Steffi (7 anos), tenta segurar as pontas dentro da grande casa onde vivem na Suécia. A casa é bastante caótica, nada diferente do que se poderia esperar de meninas nessas faixas etárias que desconhecem uma rotina de disciplina e cuidado. As irmãs vivem de forma anárquica e independente, criando seus próprios meios de sobrevivência. Assim como os animais de rua, que quando famintos precisam de certa selvageria para conseguirem preservar suas vidas e a de seu bando, as meninas, por vezes, adotam comportamentos selvagens também. Seus rostos mostram uma postura de enfrentamento com o mundo à sua volta, os problemas batem à porta e elas estão prontas para rosnar para eles. 

Onde assistir: O filme foi exibido na 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e ainda não tem data para chegar aos streamings do Brasil.

Leia a crítica de Paraíso em Chamas aqui (por Mari Dertoni).

• Priscilla 

Direção: Sofia Coppola
País: Itália/Estados Unidos

Coppola usa uma linguagem clássica e um olhar delicado ao retratar aspectos íntimos de um relacionamento que passa por diversas nuances entre o público e o privado, utilizando a mise en scéne para destacar o isolamento de Priscilla, e trabalha com escalas para dar a dimensão de sua solidão. Trata com delicadeza os ambientes preenchidos pela pequenina protagonista, que esbanja uma singeleza e fragilidade que aos poucos ganha solidez e força. Partindo de uma biografia, a diretora respeita o olhar da autora, por mais controverso que ele possa parecer. Tendemos a querer nos solidarizar com Priscilla, mas ela não chega a vilanizar seu marido. O longa eterniza na telona um romance contado do lado de dentro da história.

Onde assistir: Em cartaz nos cinemas, em breve estará disponível na Mubi Brasil

Leia a crítica de Priscilla aqui (por Mari Dertoni).

• Saltburn

Direção: Emerald Fennell
País: EUA, Reino Unido

O segundo longa de Fennell dialoga diretamente com a sedução, como Pasolini fez em Teorema, um desconhecido devasta uma família aristocrata, e por meio de artifícios quase hipnóticos, os faz se submeter a ele. A diretora usa excessos cênicos e extravagâncias em demasia para moldar seu universo de perversões. Barry Keoghan protagoniza como uma versão contemporânea “do visitante” de Pasolini. Fennell apela para o uso de cenas mais explícitas com artifícios nada modestos decorrentes da (também ótima) atuação de Jacob Elord.

Onde assistir: Disponível para assistir no Prime Video.

• Birth/Rebirth

Direção: Laura Moss
País: Estados Unidos

Birth/Rebirth é um terror psicológico onde uma mãe que perdeu sua filha pequena se une a uma médica obsessiva na saga de trazer a criança de volta à vida. Trata do peso da maternidade solo e dos horrores do luto. Primeiro longa dirigido por Laura Moss, que consegue trazer um prisma assustador e original ao tema.

Onde assistir: Ainda não está disponível em nenhuma plataforma digital

• Túnica Turquesa 

Direção: Maryam Touzani
País: Marrocos, França

O ordenamento jurídico marroquino criminaliza a relação afetiva entre pessoas do mesmo sexo. O perturbador e desumano artigo 489 do Código Penal do país norte-africano pune “atos licenciosos e contranatura com pessoas do mesmo sexo” com penas de seis meses a três anos de prisão e multas. Não só atribui pena privativa de liberdade, como expõe publicamente pessoas LGBTQIA+. Nesse contexto de repressão violenta a pessoas LGBTQIA+ de forma plenamente chancelada e instrumentalizada pelo Estado, a diretora Maryam Touzani constrói Túnica Turquesa, exibido no Festival de Cannes na Mostra A Certain Regard, um drama de discrição e sutileza muito pautado nos gestos e olhares para abordar tanto a homossexualidade no Marrocos. Num país que criminaliza a relação de duas pessoas do mesmo sexo, Maryam Touzani encontra um caminho que se mostra belo e gentil para representar o que significa ser LGBTQIA+ naquele lugar.

Onde assistir: O filme foi exibido na Mostra de Cinemas Africanos e ainda não tem data para chegar aos streamings do Brasil.

Leia a crítica de Túnica Turquesa aqui (por Natália Bocanera).

• Jogo Justo

Direção: Chloe Domont
País: Estados Unidos

Jogo Justo é um thriller “quase erótico”, cheio de erotismo, mas que não cai tanto no estereótipo do termo. Nele, um casal que vivia um romance secreto no trabalho, começa a ter problemas conjugais quando a figura feminina da dupla recebe a promoção que era aguardada pela figura masculina. Isso abala totalmente a dinâmica da relação, que já era um tabu por questões profissionais, e se transforma numa avalanche de disputas veladas, inveja e desrespeito. A diretora consegue trabalhar bem o maniqueísmos acerca do que se torna esse divisor de águas, do ponto de vista machista dentro da relação do casal e das atribulações femininas em um meio corporativo em que a protagonista se encontra quase totalmente cercada por homens e se destaca de muitos deles.

Onde assistir: Disponível para assistir na Netflix

Confira as listas individuais e mais extensas de melhores filmes dirigidos por mulheres em 2023 de nossas colunistas no Letterboxd >>
Lista da Mari Dertoni
Lista da Natália Bocanera

Authors

  • Jornalista carioca, estudou cinema na Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, certificada em roteiro pelo Instituto de Cinema de São Paulo. Ama cinema de horror e os grandes clássicos.

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  • Advogada, cofundadora, editora e crítica de cinema no Coletivo Crítico.

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