Honey Bunch | 2025

Honey Bunch | 2025

O cinema permite florear relacionamentos cujos modelos encontramos na vida real  e abordá-los de infinitas formas e simbolismos. Não tem obrigação alguma de ser parâmetro educacional ou reflexivo, mas muitas vezes o é. Noutras, resume-se a uma boa história ser contada. Honey Bunch, suspense canadense dirigido por Madeleine Sims-Fewer e Dusty Mancinelli que fez parte da Berlinale Special da edição de 2025 do festival, vai traduzir, em seus protagonistas Diana (Grace Glowicki) e Homer (Ben Petrie) como um relacionamento tóxico pode se tornar, pelo olhar cinematográfico, fofo e adorável, sem que isso configure uma abordagem problemática.

Depois que Diana sofre um acidente, que lhe causou perda de memória e frequentes dores de cabeça, seu devotado marido Homer a interna numa clínica que oferece um tratamento experimental de recuperação total. A terapia unida à dedicação do esposo, que se interna junto com a recuperanda, são, segundo o proposto, a fórmula para a cura. Quanto mais o tratamento avança, porém, mais Diana se envolve em visões fantasmagóricas, saltos temporais e alucinações, que vão se misturando às suas memórias, gradativamente em retorno, e cada vez maior a estranheza que rodeia o lugar – e as pessoas que ali estão, a incluir, Homer. 

A personagem começa a investigar sua própria situação, como alguém que assiste a si mesmo de fora, dando-se conta que a terapia parece afastá-la de sua própria personalidade. O tratamento é inusitado: luzes piscando, exercícios físicos intensos, medicamentos, jantares à luz de vela com o marido, alimentação detoxificante. Diana é, e assim se percebe no decorrer do filme, como uma planta que precisa ser cuidada num belo jardim, mas que está fora de seu próprio controle. Atendendo a essa representação, a direção de arte é certeira na construção de um ambiente repleto de folhagens, interna e externamente à clínica, seja na sua forma natural ou artificial, como, por exemplo, num papel de parede. Honey Bunch vai carregar, ainda, uma atmosfera e fotografia vintage que compõe um bom equilíbrio ao suspense, e que auxilia a proporcionar o encantamento duvidoso do casal.

Sob o manto da devoção e do amor de homens dedicados, notoriamente a clínica vem retratar uma espécie de aprisionamento e manipulação feminino disfarçado de ambiente amigável e acolhedor. Ao passo que vamos compreendendo a natureza do que de fato é a terapia e seus objetivos, porém, a ideia de proposição de um encarceramento entra em conflito com o compadecimento que sentimentos com relação àqueles responsáveis por conduzirem as mulheres em tal situação, o que traz uma dualidade complexa que torna tudo ainda mais instigante, e que não se preza a julgar ou impor moralismos aos seus personagens.

De fato, o medo e a insegurança masculina quanto ao amor é capaz de muito. Para alcançá-la, buscar-se-á, quando e quanto possível, a melhor versão de uma única mulher, ainda que isso implica podá-la. Entretanto, quando o jogo se inverte, a prova de amor exigida pode vir, inocentemente, acompanhada do questionamento: “você se afogaria por mim?” O mais, deixo para o filme. Ah, a candura dos relacionamentos tóxicos! 

Nota:

Author

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *