Plano 75 | 2023

Plano 75 | 2023

O Japão é o país com a população mais idosa no mundo, sendo aproximadamente 29% de seus moradores formada por pessoas com 65 anos ou mais. No Brasil, a título de exemplo, esta faixa etária corresponde a 10,9% da população. 

Partindo dessa realidade do país oriental como premissa, a diretora japonesa Chie Hayakawa faz em Plano 75 o espectador embarcar em uma distopia. No Japão, estaria em vigor o “Plano 75”, projeto governamental que, em troca de um aporte financeiro a ser usado de forma livre pelo idoso, quando este chegasse aos setenta e cinco anos, teria que cometer a eutanásia, visando poupar o resto da sociedade com gastos como, por exemplo, na previdência social, afinal, os custos a serem suportados pelo país, estariam levando-os a serem alvos de crimes de ódio.

Ainda que este pressuposto seja manifestamente interessante, as opções tomadas por Hayakawa servem de diques para uma trama mais ágil, sobretudo, por optar pelo silêncio prolongado em significativa quantidade de cenas e por uma fotografia fincada em tons pasteis.

As escolhas da diretora neste filme, que ganhou Menção Especial no Caméra D’Or do Festival de Cannes 2022 e esteve na seleção de festivais como Toronto e Karlovy Vary, sugerem de seu interesse maior em abordar alguns temas que orbitam o Plano 75, como por exemplo, a exclusão dos idosos no mercado de trabalho e a solidão que sentem, suportando um isolamento até mesmo da própria família conforme ficam mais velhos e, assim, “inúteis” na visão daqueles que olham o outro a partir de uma mirada utilitária e, portanto, nada empática. Diante dessa aparentemente incontornável realidade na velhice, os idosos se sentem estimulados a receber um valor em dinheiro e, após, matar-se voluntariamente.

O longa-metragem acompanha a protagonista, Michi, interpretada por Chieko Baisho, que após perder o emprego, vive esse drama da solidão. Ela acaba por inscrever-se no Plano 75 e passa a fazer uso das “utilidades” oferecidas pelo governo, entre elas, a possibilidade de conversar pelo telefone com uma jovem, em uma espécie de terapia, mas que só dura quinze minutos e nada mais.

 Para além da personagem principal, a diretora visa desenvolver, também, personagens paralelos, mas que não possuem a força de Michi: uma imigrante que vai ao Japão e precisa arrecadar fundos para  o tratamento de sua filha; o idoso que possui parentesco com o funcionário governamental que irá realizar a burocracia para possibilitar sua eutanásia. Essa “pulverização” na trama, entre vários personagens, acaba por, ao final, encontrar uma intersecção que, ao mesmo tempo que orienta para o final da narrativa, deixa exposto algo que drena, de forma significativa, a força que o filme poderia ter. 

O desenrolar da trama acaba por desaguar em dois cenários, paralelos, mas com muita semelhança: uma pessoa mais jovem passa a se identificar e ter empatia por aqueles idosos que irão submeter-se à eutanásia. Essa ligação sempre vem a partir do compartilhamento de experiências que, muitas vezes, surpreendem os mais jovens que parecem ser incapazes de imaginar aqueles idosos trabalhando, se divertindo, etc.

 Como dito, ao mesmo tempo que a trama visa estabelecer esses vínculos, parece ignorar ou esquecer da premissa inicial, que justifica o denominado Plano 75. Em nenhum momento, o roteiro se preocupa em mostrar ao espectador o contexto social que “legitima” aquela medida governamental extrema. 

O longa-metragem não se dedica a mostrar o substrato autoritário daquela sociedade japonesa que aprovou o Plano 75, contudo, dedica-se a trazer em tela, em várias cenas, exatamente aquilo que o contradiz, que é justamente as relações de empatia que jovens passam a ter com idosos que, em um curto período, acabarão se rendendo às consequências do desumano projeto. Ou seja, mostra ao espectador “apenas” aquilo que, de forma frontal, atinge a premissa do filme, o que parece ser uma escolha contestável.

Assim, Plano 75 parte de um pressuposto interessante e que tem o condão de atingir temas igualmente relevantes, como a solidão e a exclusão dos idosos do mercado de trabalho, contudo, sua força é dispersada, seja pela falta de um desenvolvimento adequado de parte dos seus personagens, seja pelas escolhas de um roteiro que parece atentar contra si próprio.

Plano 75 estreia nos cinemas do Brasil no dia 25/04/2024 e é distribuído no país pela Sato Company.

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